Sempre que leio a notícia da morte de alguém famoso sinto a mesma inquietação: como terá morrido? Como que vida interior terá morrido? Com que sensação terá morrido? Que medos, receios, dúvidas ou certezas o assaltaram no exato momento em que soube que morria?
Poderá parecer, mas esta inevitável inquietação nada tem de mórbido. De há uns anos para cá que a morte tem sido uma companhia tão natural e quotidiana como a própria vida. E isso não me impede de viver e aproveitar a vida, pelo contrário: põe todas as coisas sob um novo olhar, sob uma nova perspetiva. Depois, a escolha é minha, de permitir ou não que a morte interfira na vida ou, sendo inevitável que isso aconteça, em que medida permito que a morte se intrometa na vida.
Saber-me finito e preocupar-me memória tem, efetivamente, um determinado peso no que sou, digo e faço. Se àquela finitude juntar então a infinitude de Filho - que acredito que sou - percebo que tudo ganha uma matiz diferente, um outro peso, uma outra importância. Percebo que há preocupações que são vãs, que há alegrias que são vãs, e que todas as vitórias e derrotas são ocasionais, momentâneas, irrisórias no imenso que somos, ainda que potencialmente devastadoras na pequenez que julgamos ser.
A extraordinária facilidade e efetividade com que penso no Américo, no Lino, na Carmen, no meu sogro, na Teta, em tantos outros que me morreram mas ainda assim em tantos momentos permanecem vivos em mim, permite-me acalentar a esperança que o mesmo aconteça comigo nos meus. E quando acontecer, as coisas pequeninas da vida que tanto me envergonham serão isso mesmo, coisas pequeninas, esquecidas ou recordadas em tom jocoso, porque as memórias grandes e importantes ficam agarradas ao que é verdadeiramente grande e importante, significativo, determinante no que foi uma vida.

Comentários

Mensagens populares deste blogue