20160427


Convivi com a Samaritana durante todo o ano. Conheci-lhe as voltas, debrucei-me sobre os seus pormenores, aprendi a linguagem que permanecia escondida, deliciei-me com a sua simplicidade, falei da sua atualidade. Ter que a transmitir quase todas as semanas fez com que a olhasse uma e outra vez e apreendesse o que sempre me permanecera velado. Ou pouco importante. Recentemente, foi sobre o "Eia! Vinde ver um homem que me disse tudo o que fiz!" Porque seria tão importante para ela que Ele soubesse tudo o que ela tinha feito?

Conheço perfeitamente a resposta porque também eu, recentemente, o poderia anunciar àqueles de quem tão cuidadosamente me escondia.

Poder ser visto tal como sou, sem máscaras ou fingimentos, e ainda assim sentir-me amado é um privilégio que raramente conheci. Muito provavelmente por culpa própria, por desespero ou insegurança, por não me reconhecer do outro lado do espelho, por desejar sempre ser outro alguém que não eu, por invejar ter a sabedoria ou a calma ou quaisquer outras capacidades que os que me rodeiam têm, profusamente, ao seu dispor.

Poder dizer, olhos nos olhos, inteiramente e de peito aberto, o que me vai na alma, confiando absolutamente no amor que me será devolvido, confere-me uma serenidade até há pouco perfeitamente desconhecida, apesar de intensamente desejada... e procurada!

O amor, o verdadeiro amor, é, por isso, profundamente libertador. Quem se sente verdadeiramente amado não tem que entrar em joguinhos de aparências, não tem que se colocar em bicos de pés, não tem que usar máscaras que apenas nos afastam uns dos outros e de nós próprios. Quem se sente verdadeiramente amado vive feliz apenas por isso, porque sabe e sente que é verdadeiramente amado! Não se preocupa com posse, não perde tempo com esquemas de controlo, não questiona sequer se esse amor é correspondido, porque sabe-o, sente-o, vive-o, num sereno descontrolo de si próprio e da sua racionalidade.

E, aparentando o grande sossego marinho, quem se sente verdadeiramente amado vive intensamente feliz a mais turbulenta das tempestades!

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Sentar e conversar. Nem sempre resulta. Aliás, é um processo, um caminho com várias etapas, sendo que apenas resulta no final. Mas até chega...