20220818


É sempre assim: por volta desta altura das férias, sinto uma enorme necessidade de me voltar a sentar ao computador e preparar o futuro.

A nível profissional e pessoal sou de projetos. Não consigo ficar quieto por muito tempo e tenho aquela doença das borboletas na barriga que me leva a desejar meter-me de cabeça quando um bom projeto me é bem apresentado. Com alguma facilidade, emprenho pelos ouvidos e, uma vez metido, não sei viver de outra forma que não seja totalmente imerso no que faço, e como os dias me são pequenos, é muito frequente que as noites sejam povoadas com aquilo que, de dia, me ocupa o ser. Se é verdade que Deus nos fala através dos sonhos, então Ele é um chefe que não se cala. E às vezes bem precisava do descanso!

A minha forma de fazer tem algo a haver com as vacas: primeiro engulo tudo sem mastigar e só depois, nas minhas caminhadas, na minha elíptica, nos momentos em que aparentemente estou a fazer cera, é que o que me alimenta volta à atualidade e aí é devidamente processado, por vezes durante semanas, para que possa finalmente ser distribuída. Durante esse processo mantenho os olhos abertos e os ouvidos atentos a todos os contributos que, conscientemente ou não, me possam chegar através do imenso que me rodeia. Tenho o privilégio de trabalhar com pessoas bem mais tudo que eu e que ainda por cima não se importam de se partilhar comigo, tendo eu apenas que recolher, processar e redistribuir, numa espécie de hipermercado do ser, em que nada produzo mas vivo à custa de colocar nas prateleiras a produção dos outros.

Hoje é esse dia. Em que me sento, registo uma e outra vez os projetos em que estou metido - Graças a Deus! - e recomeço o plano.

Adoro este nervoso miudinho :-)!

 

20220817

vergonha

Todos nós já sentimos, em alguma altura, vergonha alheia. Seja com um tio desbragado numa qualquer cerimónia, um amigo que sabemos ser impecável apesar do seu ocasional comportamento desapropriado, ou, neste caso, com uma Igreja que sabemos, por experiência própria, ser imensamente mais do que aquilo que tem sido manifestamente noticiado. Nestas alturas não tenho por hábito sacudir a água do capote: defendo, quando muito, calo, e deixo para uma outra altura uma conversa mais apropriada que nos permita enriquecer mutuamente. 

Nesta altura é-me particularmente difícil lidar com a vergonha que, ainda por cima, não sinto como propriamente alheia mas como também minha, da família que escolhi para viver comigo a fé: a Igreja. Em momento algum senti que este era um problema que não me diz respeito. Não porque tenha contactado direta ou indiretamente com casos de pedofilia ou qualquer tipo de abuso físico, mas porque, agora que se têm provado - ainda que não em tribunal - tornam mais clara uma realidade que eu pensava (desejava) longínqua. 

Sobre estes casos só podemos ter tolerância zero. Ponto final. Sem mas, sem porques, sem atenuantes, quaisquer que elas sejam. Aconteceu suspeita de abuso? Comunica~se às autoridades competentes (civis, claro), e ativam-se os procedimentos de mútua proteção até ao apuramento da verdade. Confirmou-se? Condene-se. Não era verdade? Condene-se quem acusou. Assim. Simples. O único cuidado que se deve ter é o do direito à privacidade, particularmente se existirem crianças envolvidas, pelo que se dispensa tanto a condenação em praça pública como a condenação em praça exclusivamente eclesial. Abuso é pecado, sim, e acredito que a misericórdia do Pai não tem limites, mas é também crime, e não pode ser escondido ou varrido para debaixo do tapete. 

E quando alguém me aponta o dedo, porque sou católico, a minha resposta é apenas uma: baixar a cabeça e dizer que têm razão. Também eu estou na berlinda. 

Bambora

  Não é estranho que nos digam que «ser homem é muitas vezes uma experiência de frustração». Mas não é essa toda a verdade. Apesar de todos ...