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O maior desafio da minha vida são os meus filhos. Já o eram muito antes de terem sido concebidos, muito antes até de eu sequer pensar em namorar. Não que eu racionalizasse muito o facto - aquilo que é verdadeiramente importante na minha vida é muito mais intuído que pensado (mais abandonado que controlado) - mas justamente porque sabia que havia uma série de princípios que sentia que seria da minha responsabilidade transmitir-lhes. A fé, o respeito, o compromisso, a educação do olhar, a liberdade e cuidado de descobrir o seu lugar no mundo sempre foram o caldo cultural onde foram cozinhados. Nunca fui muito de exigir resultados porque eu próprio valorizo muito mais o processo, o caminho, que as conquistas. O meu olhar dirigiu-se sempre muito mais para o empenho que para as notas, para o equilíbrio que para o sucesso, para o sentido que para a glória. Ao longo do seu percurso tive alguns amargos de boca, claro - foram bem maiores os que eu lhes provoquei - mas hoje, que são já todos adultos e já não pago mesadas a ninguém, são, sem dúvida, o meu maior orgulho e a certeza que, afinal, talvez tenha contribuído para que o mundo seja bem melhor. Por eles e com eles é-o com toda a certeza.

Sempre que estudo algo sobre a Bíblia, a fé ou a cultura em que estamos mergulhados - que, misturados com a psicologia e a filosofia, são os temas que me interessam verdadeiramente - tenho sempre os meus filhos como pano de fundo. Como lhes hei de transmitir isto? Como irei encaixar isto nas nossas conversas? Como conseguirei passar-lhes este lado da visão das coisas? Naturalmente, sendo eu pai deles, conto que eles desliguem ao fim de 15 segundos - isto se tiver oportunidade de dizer qualquer coisa, por entre discussões de política e saúde e leis e o que quer que seja - pelo que vou arranjando, meio inconscientemente, estratagemas para captar a sua atenção. E quando isso acontece - e como fico feliz quando isso acontece! (sem o deixar transparecer, claro) - sei que o verdadeiro desafio é o que virá a seguir: que, sendo eles livres, cultos, interessados e comprometidos com o mundo à sua volta, me vão colocar precisamente o seu lado da questão e que, não raras vezes me vejo na necessidade de voltar ao estudo do tema para lhes conseguir ir respondendo.

Ser pai é o grande cumprimento da minha vida. Afetivamente é avassalador, e há alturas em que pouco sobra. Intelectualmente é profundamente desafiante, porque é aquela parte que não cabe na expressão "pai é pai", não é um lugar que se tenha adquirido por nascimento mas que tem que ser conquistado. E esse sempre foi uma preocupação da minha parte. Talvez porque naquela parte em que "pai é pai", nem sempre tenha sido capaz de estar à altura, e os imagine a dizer isso com um sentimento de inevitabilidade, encolher de ombros e revirar de olhos.

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