A cada morte, a cada notícia de morte, a cada confronto com a morte dos outros, inevitavelmente penso na vida. Hoje vínhamos a conversar justamente sobre esse confronto, sobre o como e sobre o que vale ou não a pena viver. O Padre Almiro dizia sempre que mais vela uma vida gasta que uma vida enferrujada. Sim, mas... e a dor? Vale a pena viver a dor? Em nome de quê? E o sacrifício? Vale a pena o sacrifício? Em nome de quê? Até que ponto?
A minha experiência vai-me dizendo que tudo isso pode valer a pena. Se formos felizes. Verdadeiramente felizes. Não permanentemente alegres, que isso, para além de ser idiota, é impossível. Mas intimamente felizes, como apenas quem vive em sintonia consigo e com aquilo a que se sente chamado a ser é. Naturalmente, uma sintonia assim só se atinge depois de muita escuta e de muita cabeçada na parede. Depois de começar e recomeçar imensas vezes, tantas aquelas em que se duvidou se aquele era, de facto, o nosso caminho. Porque a felicidade não pressupõe a ausência de tristeza. Ou de dor. Ou de desespero. Isso tem outro nome: alegria. E a felicidade nem sempre é alegria. É também, por vezes, dor. Mas a felicidade pressupõe a aceitação transformadora do que dói, encarando-o e trabalhando-o para que ganhe sentido: se dói, há um sinal qualquer que eu não vi e preciso ver para poder trabalhar, e transformar.
Se me perguntarem, dificilmente direi que vale a pena viver a dor. E o sacrifício. A não ser para podermos ser e fazermos ser mais felizes. Se não o formos, se não o conseguirmos fazer ser, se, apesar dos momentos de alegria, a dor permanece, esse é um sinal de que precisamos de mudar. Dentro de nós. Ou fora de nós. Sob o risco de deixarmos a vida escapar-se-nos por entre os dedos. Por muito que a tentemos agarrar.
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